Trabalho no morro consolida entidade como referência nas áreas da assistência social, educação, esporte, profissionalização, música, lazer e psicológica

As coisas nunca foram fáceis para a Associação dos Amigos da Casa da Criança e do Adolescente do Morro do Mocotó (ACAM) mas, especialmente neste ano de 2020 em que oficialmente completou 25 anos, com a pandemia do novo coronavírus, mostrou porque é o principal grupo de resistência junto à comunidade.

Em março, a ACAM poderia muito bem ter seguido as orientações da Prefeitura de Florianópolis ou do decreto de calamidade pública instituído pelo governo do Estado de Santa Catarina e simplesmente ter fechado as portas e demitido os professores. Mas deixar funcionários, 192 crianças e adolescentes matriculados e suas famílias na mão, nunca foi prática da instituição, ainda mais num momento tão sério e delicado como este. Nestes anos todos a ACAM tornou-se um oásis de oportunidades e assim permaneceu em meio à adversidade.

O presidente da ACAM, Cláudio Floriani Ramos Júnior, conta que a pandemia atropelou o planejamento e foi necessário se reinventar. No início do ano, conseguiram junto à Secretaria de Assistência Social redirecionar parte dos recursos previstos para a alimentação para a aquisição de cestas básicas, já que muitas crianças só fazem as refeições na Casa.

“Passamos a distribuir alimentos e ampliamos a cesta com produtos de higiene e limpeza. Muita gente começou a ajudar com projetos e doações. Parcerias foram mantidas e novas foram sendo firmadas.” Cláudio diz que foi necessária uma reorganização para determinar como continuar o trabalho neste novo momento.

Além de ajudar a comunidade a obter comida, passou a cadastrar os moradores nos programas assistenciais governamentais, como o do auxílio emergencial e de doações de computadores e celulares para quem precisava dar continuidade aos estudos em casa.

Outra alternativa de sustento e renda que foi viabilizada em parceria com o Instituto Pe. Vilson Groh (IVG) e o Banco Comunitário ICOM (Instituto Comunitário da Grande Florianópolis) foi a Moeda Social. O objetivo é garantir o acesso a alimentos, produtos de higiene e de limpeza, fortalecer os pequenos negócios e fazer com que o dinheiro circule dentro da comunidade.

“Quando eles precisam, vêm até nós pedir ajuda”, comenta o presidente. “Eles nos veem como uma ponte para conseguir o que têm direito”, acrescenta a coordenadora administrativa, Selma Vultuoso da Silva.

 

O sonho da irmã Hedwiges realizado

A ACAM é o resultado de um trabalho árduo iniciado no final da década de 70, sob a liderança da irmã Hedwiges Hofer. Em 1979, ela “ouviu o clamor dos pobres” e subiu o Morro do Mocotó para cuidar dos bebês da creche da Sociedade Alfa Gente. Lá, passou a se relacionar com os moradores, com as mães e, em 1982, decidiu, definitivamente, residir no local, onde exerceu um papel fundamental junto às famílias, de apoio em todas as reivindicações, principalmente as que envolviam crianças e adolescentes.

Naquela época, sua preocupação era atender, tratar e cuidar daqueles meninos e meninas que não tinham onde brincar depois que saíam da escola, que viviam nos becos, correndo entre valas de esgoto e quase sem perspectiva de futuro.

Hedwiges não descansou enquanto não construiu um espaço adequado para acolhê-los no contraturno escolar, dar suporte aos estudos, ocupá-los nas mais diversas oficinas e direcioná-los para o mercado de trabalho. Em 1982, foi inaugurada a Casa da Comunidade, por onde passou boa parte das crianças da época.

Nos anos de 1987 e 1988, nasceu outro projeto, o da Casa da Criança e do Adolescente, sob a liderança da irmã Hedwiges. Foi o sonho da irmã realizado. Em 1995, com a necessidade de formalizar as atividades, surge a Associação dos Amigos da Casa da Criança e do Adolescente do Morro do Mocotó.

A irmã Hedwiges teve um papel central no morro, tanto relacionado à ACAM, quanto ao território como um todo. Até 2019, quando completou 40 anos de Mocotó e por conta de um acidente precisou ir embora, participou de todas as etapas da instituição. Ocupou por anos as funções de presidente, mas também estava presente no dia a dia, auxiliando na cozinha, conversando com as famílias, fazendo carinho e acolhendo as crianças. Ensinou a comunidade a lutar por seus direitos e atuou ativamente na solução de problemas relacionados à terra, infraestrutura, saneamento, lixo, água, entre tantos outros.